Os bancos estão se tornando museus tecnológicos
- Darci de Borba
- 20 de jun. de 2023
- 5 min de leitura

Os bancos estão se tornando museus tecnológicos. Uma afirmação ousada, de fato, e uma que fez as manchetes recentemente, cortesia de Antony Jenkins, ex-CEO do Barclays e atual CEO da 10x Banking. Jenkins não está sozinho nessa avaliação. De fato, um estudo recente conduzido pela 10x Banking, intitulado "Global banks and the transformation illusion slowing progress", apresenta algumas estatísticas impressionantes que sustentam essa visão (10x Banking, 2022).
No mundo acelerado e cada vez mais digitalizado de hoje, não é surpresa que as instituições financeiras estejam lutando para acompanhar. Afinal, segundo a pesquisa, 20% dos bancos admitem perder clientes devido à experiência pobre que oferecem. Além disso, 64% dos bancos confessam sua incapacidade de atrair novos clientes devido à lentidão na implementação de sua transformação digital.
Mas por que isso está acontecendo? E o que os bancos podem fazer para evitar se tornar obsoletos?
O problema principal, como Jenkins aponta, é que os bancos confundem inovação com transformação. De acordo com Schumpeter (1942), a inovação implica a aplicação de novas ideias, enquanto a transformação é a reconfiguração de uma estrutura existente. Os bancos têm se concentrado em melhorias incrementais, o que Schumpeter chamaria de inovação, em vez de transformação - mudanças estruturais que desafiam o status quo e permitem que as instituições financeiras se adaptem de maneira mais eficiente e eficaz ao ambiente digital em constante mudança.
Uma estatística final da pesquisa destaca a urgência da situação. Surpreendentemente, 94% dos gestores estariam dispostos a mudar para outro banco se este oferecesse tecnologias superiores. Com essa pressão vindo de todos os lados, como os bancos podem fazer a transição de museus tecnológicos para inovadores da indústria?
A solução, de acordo com a 10x Banking, está em abraçar totalmente a transformação digital. A empresa nomeou recentemente Virginia Gambale para o seu Conselho de Administração. Gambale, uma experiente líder de tecnologia e investidora com conhecimento profundo dos serviços financeiros, desempenhará um papel fundamental na aceleração do progresso tecnológico para as instituições financeiras (10x Banking, 2022).
Os bancos precisam aprender com empresas como a 10x Banking e adotar uma abordagem de transformação em vez de inovação. Isso pode significar repensar completamente a forma como operam, ao invés de fazer pequenas melhorias incrementais. Como argumenta Bower e Christensen (1995), as empresas devem se concentrar em inovações disruptivas, em vez de apenas inovações sustentáveis. As inovações disruptivas têm o potencial de mudar completamente a indústria, enquanto as inovações sustentáveis apenas melhoram os produtos existentes.
Bancos Perdendo o Controle?
Os bancos parecem estar em uma encruzilhada. Por um lado, a necessidade de transformação digital nunca foi tão clara. Por outro lado, existe o receio de que, ao abraçar essa transformação, os bancos possam inadvertidamente abrir a porta para que as fintechs assumam o controle de sua cadeia de valor. Afinal, as fintechs são conhecidas por seu domínio no campo tecnológico, e existe o risco real de que os bancos possam ser relegados ao papel de meros intermediários.

É aqui que a teoria de disintermediação entra em cena, uma teoria que prevê a possibilidade de os bancos serem marginalizados em sua própria indústria (Hagel III, 1997). De acordo com a teoria da disintermediação, as empresas tecnológicas podem fornecer os mesmos serviços que as instituições financeiras, mas de uma maneira mais eficiente e a um custo menor, graças à tecnologia avançada e ao baixo overhead. Portanto, os clientes podem escolher fintechs em vez de bancos, o que pode levar à disintermediação das instituições financeiras.
No entanto, é necessário analisar essa questão por um ângulo diferente, um que desafia o medo dos bancos e propõe uma nova maneira de pensar sobre a transform ação digital. Este é o conceito de "plataformização" proposto por Van Alstyne et al (2016). De acordo com os autores, em vez de temer a disintermediação, os bancos devem se tornar plataformas que permitem que várias partes interajam e façam transações.
Os bancos, em vez de temer a perda de controle, devem abraçar a oportunidade de se tornarem plataformas. Neste modelo, os bancos podem fornecer o ecossistema e as ferramentas necessárias para que diferentes players – incluindo fintechs, empresas de tecnologia, clientes e até mesmo outros bancos – possam interagir e realizar transações. Nesse cenário, os bancos ainda mantêm um papel vital, enquanto aproveitam os benefícios da transformação digital.
Para permanecerem relevantes e competitivos, os bancos precisam confrontar seus medos e tomar medidas audaciosas para se transformar. Afinal, a alternativa - se tornar um museu tecnológico - é simplesmente inaceitável. Os bancos têm a oportunidade de redefinir seu papel e valor na economia digital, mas isso exige coragem, visão e, acima de tudo, uma disposição para se transformar.
Uma Luz no Fim do Túnel?
A despeito das notícias alarmantes sobre a lentidão da transformação digital nos bancos, o relatório recente da McKinsey sobre a maturidade digital no Brasil lança um contraponto otimista. Segundo o relatório, o Brasil está avançando em termos de maturidade digital, com empresas de diferentes setores abraçando cada vez mais a digitalização de suas operações (McKinsey, 2019).

De acordo com o relatório, a maturidade digital pode ser definida como a capacidade de uma organização utilizar tecnologia digital para impulsionar melhorias significativas no desempenho e no alcance de suas operações. A maturidade digital é medida em uma escala de 1 a 5, sendo 1 a fase inicial e 5 a fase mais avançada.
Contrariamente à ideia de que a transformação digital nos bancos está atrasada, o relatório da McKinsey sugere que algumas instituições financeiras brasileiras estão demonstrando alto nível de maturidade digital. Isso é uma evidência encorajadora de que, mesmo diante dos desafios, os bancos estão começando a entender o verdadeiro valor da transformação digital.

No entanto, o relatório da McKinsey também ressalta que ainda há um longo caminho a percorrer. Mesmo as instituições mais avançadas têm muito a fazer para atingir o nível 5 de maturidade digital. A lacuna entre onde os bancos estão agora e onde precisam estar é substancial.
Isso leva à questão: como os bancos podem acelerar sua jornada de maturidade digital?
O relatório sugere que é essencial desenvolver uma estratégia digital clara, promover uma cultura de inovação e construir uma infraestrutura digital robusta. Esses são todos aspectos da transformação digital que foram discutidos anteriormente neste artigo.
O relatório da McKinsey nos oferece uma visão mais matizada da transformação digital no setor bancário. Sim, há desafios e sim, há espaço para melhoria. No entanto, também há progresso sendo feito e motivos para otimismo. A maturidade digital não é um destino, mas uma jornada. E é uma jornada que, apesar de suas dificuldades, os bancos precisam continuar a trilhar.
É notório que os bancos precisam fazer mais do que apenas inovar, eles precisam se transformar. Com a ameaça de se tornarem museus tecnológicos, é fundamental que as instituições financeiras adotem uma mentalidade de transformação digital, em vez de se concentrarem apenas em inovações incrementais. Ao fazer isso, eles serão capazes de oferecer aos seus clientes a experiência de alta qualidade que eles exigem e, ao mesmo tempo, permanecerem competitivos no mundo digital de hoje.
Referências:
10x Banking. (2022). Global banks and the transformation illusion slowing progress.
Bower, J. L., & Christensen, C. M. (1995). Disruptive technologies: catching the wave.
Schumpeter, J. A. (1942). Capitalism, Socialism and Democracy. Harper & Brothers.
McKinsey & Company. (2019). Transformações digitais no Brasil: Uma avaliação da maturidade digital no país.
Hagel, J. (1999). Net gain: Expanding markets through virtual communities. Journal of interactive marketing, 13(1), 55-65.
Van Alstyne, M. W., Parker, G. G., & Choudary, S. P. (2016). Pipelines, platforms, and the new rules of strategy. Harvard business review, 94(4), 54-62.
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